Freud, me tira dessa! (Laura Conrado)

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Freud-me-tira-dessaQuando comentei com a Laura Conrado que estava lendo “Freud, me tira dessa!”, ela ficou feliz e apreensiva. Ela logo me disse: “você é exigente”. Na hora, achei graça, porque, certamente, ela estava se referindo, inconscientemente, ao período no qual trabalhamos juntas. Naquela época, ela criava os textos e eu tinha a ingrata função de revisá-los. Não que eu tivesse muita coisa para corrigir, porque ela realmente tem uma intimidade muito grande com as palavras, mas sempre deixamos passar alguma coisa, não é?

Nunca fui uma leitora de Chick-Lit. Não por preconceito ou algo do tipo, a questão é que, talvez, nunca tenha chegado um Chick-Lit às minhas mãos quando eu estava procurando, avidamente, por um livro. Como, então, cheguei a “Freud, me tira dessa!”? Primeiramente, porque sou amiga da autora, e queria conhecer sua escrita literária; a jornalística, eu já tive o prazer de conhecer e de aprovar, mas a literária ainda era uma incógnita para mim. E outra coisa que fez com que eu me interessasse pelo livro foi o título. Gosto muito de Psicanálise, não como uma estudiosa, mas como uma curiosa. Leio artigos, livros e vejo palestras referentes à Psicanálise. Então, um livro chamado “Freud, me tira dessa”, chamou a minha atenção quase que imediatamente. Quando li o referido livro, ele ainda não tinha vencido o prêmio de melhor Chick-Lit Nacional de 2012.

Laurinha, toda animada, com o merecido prêmio de Melhor Chick-Lit Nacional de 2012.

Laurinha, toda animada, com o merecido prêmio de Melhor Chick-Lit Nacional de 2012.

Antes de começar a falar do enredo do livro, vou ser um pouquinho “exigente”, mas isso é só para que eu fique com a minha consciência tranquila. Deixe-me explicar melhor. Eu realmente acredito que deslizes ortográficos não comprometam a qualidade de uma obra, mas deixar de apontar a existência deles compromete a minha posição como resenhista. São coisas simples, como, por exemplo, a repetição de algumas palavras, que podem ser facilmente corrigidas pela responsável editorial em uma próxima edição do romance.

Agora, vamos ao que realmente interessa. No começo da leitura de “Freud, me tira dessa!”, já me identifiquei com a protagonista, Catarina, porque ela foi apresentada com toda a complexidade que é característica intrínseca aos seres humanos. O livro, que é narrado em primeira pessoa, começa com a protagonista “levando um fora” de um colega de trabalho com quem estava saindo. Ela teve de ouvir aquela velha história que tem, mais ou menos, o mesmo núcleo: “você é legal, é divertida, é uma excelente amiga, mas…”.

Catarina tem uma personalidade forte, e uma impulsividade que deixaria a pessoa mais impulsiva do mundo intrigada. Mas Catarina tem, antes de tudo, uma imensa dificuldade de gerenciar as suas emoções, o que acaba fazendo com que ela acredite que esteja destinada ao fracasso amoroso.

Catarina estava tão fragilizada emocionalmente que se poderia computar a quantidade de vezes que ela explodia, durante o dia. Depois do rompimento relatado no início do livro, ela foi a Divinópolis, visitar a família e tentar se recuperar do fato de, mais uma vez, sentir-se frustrada com a vida amorosa. Chegando lá, ela acabou se desentendendo com a irmã. Foi então que, ao conversar com uma prima, sentiu vontade de fazer psicoterapia.

Este coração já passou do prazo de validade, por isso, só gosto de cara errado.

Este coração já passou do prazo de validade, por isso, só gosto de cara errado.

Decidida a não amolar os amigos com o que chamava de “solteirice”, Catarina decidiu procurar ajuda profissional para lidar com a sua dificuldade em manter um relacionamento saudável. De maneira bem-humorada, ela dizia que “queria desativar o botão que repelia bons partidos e relações maduras. Sabia que tinha esse botão na cabeça.” (p.31) Por mais que se esforçasse para ter um relacionamento duradouro, Catarina sentia que sempre que permitia que os outros a conhecessem um pouco mais, acabava ficando sozinha e completamente exposta.

O enredo do livro se desenvolve a partir das sessões de psicoterapia às quais Catarina se submete, mas não fica apenas nisso. As sessões dividem o cenário narrativo com o ambiente de trabalho de Catarina e os locais de lazer que ela frequenta. A partir do processo de conhecimento de si que a Catarina passa, os leitores são apresentados à sua família, seus amigos, seu local de trabalho, entre outros.

E, à medida que Catarina começa a conseguir se enxergar, se conhecer, ela para de ser o seu próprio veneno e começa a ser a sua cura. O conhecer-se é o melhor caminho para se curar. Assim, mais do que torcer para que a Cat ficasse com o seu psicanalista, por quem havia se apaixonado durante as sessões de psicoterapia, eu confesso que torcia para que ela aprendesse a se relacionar consigo para compreender o modo como se relacionava com os outros.

Eu torcia para que Catarina percebesse que se relacionar é ficar exposto, deixar que os outros nos vejam como somos, e, quando eles não gostarem do que virem, sabermos lidar com isso da maneira mais digna possível. Mesmo que essa maneira seja, durante um dia, comer uma panela de brigadeiro e ouvir músicas depressivas e, no dia seguinte, seguir em frente.

Apesar de ter uma pegada existencial, o livro de Laura Conrado não é complicado. A autora adota o uso de uma linguagem simples e a tempera com uma pitada de humor que faz com que as complexidades do processo de cura pela fala não sejam vistas como fardos, mas sim como construtivas.

As estratégias narrativas de “Freud, me tira dessa!” contribuem para que, às vezes, pensemos que estamos lendo não um livro, mas o diário da Catarina. A escritora consegue imprimir um tom intimista ao texto de tal forma que o concomitantemente ao processo psicoterápico de Catarina, o leitor passa por uma autoanálise. Por se identificar com diversos aspectos da vida da protagonista, o leitor, ao mesmo tempo em que torce para que ela se cure, almeja, ardentemente, que quando o livro terminar, ele também encontre ferramentas para se curar. E anseia, então, que Freud o tire dessa!

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Eu sou a polpa deliciosíssima do nada.

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